quinta-feira, maio 01, 2008

Dois. Lados.

Tu tinhas a marca do corpo nos gestos descuidados das mãos, tu tinhas as mãos onde o amor não fende, tu és a pele murcha da carne, tu estás onde o osso estica o rasgão da dor. Tu tinhas o tronco no lugar íngreme da solidão, o leito desfeito no calo do peito, a precisão do medo na foz dos meus dedos. O teu olhar era fero como a água que regressa ao manancial bravo dos rios, a tua voz escarpava o silêncio no freio pontiagudo da palavra. Tu tens a mácula do papel onde a tinta não verte, tu tens o sangue onde a ferida não desagua. É o caminho do teu olhar que resvala onde a poesia não trucida o encontro da boca, é o caminho dos teus lábios que pende onde o beijo segrega o começo do teu fim. Tu tens a promessa no desfecho das tuas pernas, tu és a água que corre onde a terra nunca seca, porque tu estás onde o corpo se derrama.


(Alice Tennis Giros)



Lembro-me de uma frase. Uma frase antiga que colei na minha mesa-de-cabeceira. Dizia: No meio de um tempo qualquer, o nada pode vir a ser o tudo. Era a minha frase. O meu lema escondido dos outros. Desse tempo qualquer em que eu achava que passos alguns me levariam a ti. Mas depois aconteceu. Sem percebemos o como e o porquê chegamos lá. E entramos. Corremos as portas todas. E se houvesse o ímpeto, teríamos experimentado todas as camas. Não aconteceu. Porquê? Percebi que ser o tudo de alguém, era mais falível que a morte. Nem eu nem tu fomos ao funeral do nosso amor. (Sinto-te na saudade que é a âncora do meu coração). E continuo, já sem a frase na mesa-de-cabeceira. Sem achar que este nada que cultivo diariamente será novamente. Um dia. Um tudo. Segredo-te, nesse ouvido distante, que se pudesse voltar ao antes, faria exactamente a mesma coisa. Segredo-te porque não ouves. Não me ouves. E eu nunca aprendi a gritar.
Segredo-te que no amor que te tive fui menos eu. Menos nós. Menos vida.


(Narcisa)

2 comentários:

Anónimo disse...

Perfeito!
Só gostaria de lembrar que tudo o que se passa á nossa volta faz de nós aquilo que somos HOJE!

Anónimo disse...

Um dia Você Aprende que, depois de algum tempo você descobre a diferença, a sutil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma.

E aprende que amar não significa apoiar-se e que companhia nem sempre significa segurança.

E começa a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas.

E começa a aceitar suas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.
William Shakespeare

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