segunda-feira, agosto 29, 2005

I

São 23h acabo de jantar, levo a embalagem para a cozinha, deito tudo fora – não quero ver nada sujo à minha frente e não me apetece mexer em água. Deito-me no sofá tentado provocar uma má digestão. Olho novamente para o relógio. Mordo os dedos. Acendo um cigarro mando o fumo para a foto dela. Ainda não chegou, mandou sms a dizer “Demorei-me na reunião e ainda tenho papéis para rever. Não esperes por mim. Amo-te” – Puta. É o que ela é. Deve estar com a outra, a nova companhia dos almoços e jantares quando o trabalho não ficou acabado.
Deve estar a comê-la em cima da mesa, com vinho branco e fruta à mistura, já que se diz tão fina mas boa fodilhona.
Ligo a TV. Desligo a TV. Ligo-lhe, tem o bixo desligado. Vaca.
Acabo de rubricar umas folhas. Fecho os olhos, vejo-as juntas, sou o intermédio que não existe entre os corpos delas, entre as mãos lambidas e bocas suadas.
Abro os olhos. Acendo outro cigarro. Atropelo os passos e vomito. Caio no chão. Choro sangue. Pego na esfregona, começo a limpar a sala toda. Limpo o pó. Olho o relógio. Fecho a porta à chave. Ando nua pela casa e paro frente a frente ao espelho.
Odeio-me. Amo-a. Vou dormir na espera que a chave entre na fechadura.

4 comentários:

SL disse...

Grita! Mas nunca guardes estas coisas para ti...sufoca-te e faz-te infeliz. Gostei da nova forma de expores as palavras, está lindo rapariga!
Jinhos

Anónimo disse...

Ainda não conhecia o teu blog! Adorei todos os teus textos...

Patrícia Mota disse...

Tao forte. Adorei este novo enredo... Tem história e tem sumo de vida...

Um beijo

Monalisa disse...

Continuas a escrever muito bem. Obrigada pelas tuas palavras no sítio.