sábado, agosto 19, 2006

Chego a casa, com a luz a pressionar-me o corpo ao descanso. Chego após mais uma noite de sedução, de esbanjamento de olhares, de troca de palavras viciadas em vista de um único resultado: descarga corporal. Existe um jogo, uma disputa, uma argumentação que está preparada ao mínimo detalhe e que não tem hipóteses de falhar. Tudo está descrito na minha mente. Cada palavra. Cada sorriso. Cada toque. Tudo elaborado subtilmente de forma a ganhar o seu espaço sem que a outra pessoa repare. Ás vezes o jogo tem sucesso, e temos companhia no máximo para um mês. Mais do que isso é proibido. Tudo começa com um jantar, um lugar que surpreenda, que eu conheça bem para não haver qualquer tipo de deslize. O sucesso está em surpreendermos sempre. Causarmos espanto e surpresa mas nunca sermos surpreendidos. Se isso acontecer, está tudo condenado a um fim muito mais rápido. Do restaurante, passámos para um bar com música calma com vista para o rio. Sem carros. Apenas táxis. O toque começa aí, na parte de trás do táxi, cria-se o ambiente, com a articulação certa das palavras, com a respiração bem controlada, com o contacto entre os olhos sempre presentes, captámos a atenção e a mão poderá dar um pequeno avanço, poderá se descair. Nervosismo é coisa que está fora de moda, e não pode ser usado. Confiança é outra palavra-chave. A confiança é uma das virtudes do charme mas nasce mais cedo. A confiança escolhe as pessoas, possuía-la é algo muito dispendioso, quase que nos assassina a alma. Não a trocaria por nada. É um bem necessário. Molda-nos tudo. E a partir daí possuímos a arte de conseguirmos também moldar as pessoas como queremos, sem nunca estas o perceberem. Se o conseguirmos fazer, merecemos os aplausos finais. Merecemos o corpo nu estendido à nossa frente, pronto a ser mutilado em suor gasto, despejando o nosso desejo por todos os seus poros. Do nosso orgasmo nascem os outros orgasmos. Multiplicam-se, porque a arte também está em saber o ouvir o corpo das vítimas. Ele nós dirá como o deixar viciado, pronto a ser mutilado as vezes que o desejarmos. O corpo leva a mente aonde nós o desejámos e o resto o tempo fará.
Do restaurante e do bar, passamos a uma rotina de fazer crer. Fingir que essa pessoa faz parte da nossa vida. Fazê-la acreditar que está a viver algo de muito especial, que ela própria é especial. Afinal o que lhe oferecemos nós? Felicidade momentânea que lhe pertence durante um mês. Talvez nunca mais a venha a provar. Serviço público eficiente é o que nós fazemos. Deviam-nos agradecer. Mas isso não acontece. Portanto quando esse mês acaba o melhor que temos a fazer, é pegar nas nossas coisas e mudar de espaço. De linhas da cidade. Assim evitámos ser testemunhas de alguns suicídios ou testemunhas do nosso próprio massacre. Sim porque depois de provar tamanha felicidade, as pessoas enlouquecem e acham que a vida acabou. E talvez tenha acabado. Deixem lá. Temos outras vidas para viver, isto se acreditarem claro, se não acreditarem, então esqueçam não há fé para vocês, o melhor é mesmo matarem-se.

Aleluia.

5 comentários:

Madeira Inside disse...

Hehehe!!
Olá!!
Podes escrever coisas menos boas, podes até levar tautau de quem não gostou....eu vou para além disso porque gosto como escreves!!
E cada um sente como quer!!

Bjs

Unknown disse...

Mas nunca esquecer "uns dias são da caça e outros do caçador"!!!
Bem (d)escrito :)

Diva disse...

Matar-me??!
Para quê?,se morro tantas vezes e várias vezes por dia??!!?
Suspiro...

Penélope Almeida disse...

Quem dá e tira...



Talvez se assistisses ao teu massacre...



Enfim!

É f** qnd os papéis s invertem...


*

Eli disse...

Passei por aqui. Já tinha uma comentário, mas decidi apagá-lo!

:)