domingo, abril 30, 2006

Desarranjos I

Chamei-te. Naquele dia enquanto dormias a meu lado chamei-te minha. Não o ouviste. Não o quis. Se o ouvisses farias de tudo para não nos separarmos. E eu não podia. Tive que partir de novo para dentro de mim. Para a minha relação comigo própria. O meu corpo queria ficar preso ao teu. Como se ainda estivéssemos fundidas. Amarradas por lenços vermelhos de seda. E oiço-te a cantares as nossas músicas. Queimas-me a ausência, mesmo que não o saibas. Cantas o adeus pensando que não é o nosso. Mas é. Sempre foi. A presença do adeus esteve sempre presente. Desde o primeiro olhar. Desde o primeiro beijo. Desde o meu primeiro sinal de indiferença. Magoei-te assim tanto? Fui mimada, egoísta, arrogante, fria? A resposta é sim. Não te amei como querias, como precisavas? Eu sei que não. Mostrei-me tarde demais. Mostrei-me apenas quando já me amavas. Quando já te ocupava o corpo como se fosse meu. E era. Até ao adeus era tudo meu. Gosto deste sentido de pertença. Sempre gostei. Mas cansa-me. Distrai-me de mim própria. Nunca te quis magoar. Devia ter-te avisado. Nunca te devia ter tocado. Mas o calor. O fervor. O desejo que me esfola a pele. Que me faz esquecer o que o coração quer. Vício que mata. Vício que cura. Vício que pouco dura. Quis ser mais do que me estava permitido. Podia ter sido se estivesse ficado a teu lado. As asas puxam-me. Mesmo quando dormia a teu lado. Estava predestinada a fugir. De ti.

Naquele dia chamei-te e tu não me ouviste.

5 comentários:

K. disse...

Não há desarranjo que não possa ser consertado, Cacau. ;)

Anónimo disse...

I wonder, if I ever let you down
Did you keep on moving
I wonder, when I took my feet from off your ground
Did you keep on going

If you ever need me, just remember
All the times when we wandered free
If you ever miss me, don't you know
That i feel the same way

I wonder, did I ever fail you
Did you give up dreaming
I wonder, when I had to go
Did you stop believing

Don't you know, every sould must grow older
Our past belongs to you
And it should make you stronger

If you ever need me, just remember
All the times when we wandered free
If you ever miss me, don't you know
That I feel the same way

Don't stop moving, you must keep on going
Don't you stop believing, you should go on dreaming
Don't stop moving, you must keep on going
Don't you stop believing,
'Cause it's people like you make the world go...

If you ever need me, just remember
All the times when we wandered free
If you ever miss me, don't you know
That I feel the same way

If you ever need me, just remember
And I'll always be there
If you ever miss me, don't you know
...don't you know
...we will meet again
...we will meet


coldfinger, cover sleeve



as palavras falam por si. soa a cliché mas vou dizê-lo: não chores porque acabou, sorri porque aconteceu:)

em relação aos porquês.. porque acabou, porque não resultou.. não resultou porque não tinha que resultar, as simple as that. mas.. estarás sempre em mim e sei que sabes disso:)

GNM disse...

...
Musica longínqua, remota.
Um bêbado cambaleante fermenta na voz:
«Já não temos tempo…»

Calo-me
À luz implacável do tacto frio da ausência.

Calam-se as palavras,
Seca a tinta da caneta,
É o grito do caos.

E assim perdemos tudo…

Anónimo disse...

Eu não estou no mundo para corresponder a expectativas. É isso o que você diz. Mas, como disse Garrincha, nosso mais glorioso jogador de futebol, depois de ouvir o técnico discorrer sobre a estratégia do jogo, você esqueceu de combinar com o adversário! Abraço.

-X- disse...

Sabes, pareceu-me ouvir em fundo o "je t'aime moi non plus" do Gainsbourg (l'originale), ao ler o teu texto, palavra por palavra. Continuo a gostar imenso das tuas palavras fortes, pena a ausência delas durante tantos dias (ao que sei perfeitamente justificada mas o que não impede o sentimento de ausência).

Beijo